A crise do varejo brasileiro atingiu um dos momentos mais delicados das últimas duas décadas. Com a taxa Selic em 15% desde junho de 2025, o comércio enfrenta uma combinação devastadora. O cenário inclui crédito caro e inadimplência recorde. Além disso, os consumidores estão sem poder de compra.
Inadimplência Atinge Patamar Histórico
A situação financeira dos brasileiros chegou a níveis alarmantes. Em junho de 2025, cerca de 71,28 milhões de pessoas estavam inadimplentes, representando um crescimento anual de 7,73% comparado a junho de 2024. Esse cenário dificulta ainda mais as vendas no comércio, já que milhões de consumidores não conseguem acessar o crédito necessário para realizar compras.
O valor médio das dívidas por pessoa ultrapassa R$ 6.200, concentrando-se principalmente em bancos e cartões de crédito. Muitos brasileiros acumulam múltiplas dívidas simultâneas, criando um ciclo vicioso de endividamento que sufoca o poder de compra e prejudica diretamente as vendas do varejo.
Varejo Registra Quedas Consecutivas nas Vendas
O impacto dos juros elevados sobre o comércio é devastador. De acordo com a Confederação Nacional do Comércio, as vendas do varejo caíram por quatro meses seguidos, algo que só havia acontecido em duas ocasiões: em setembro de 2015, no ápice da maior recessão da história recente, e em julho de 2021, durante a crise do apagão. Essa sequência negativa evidencia o estrago causado pela taxa de juros mais alta em 20 anos.
As vendas recuaram 0,3% em setembro de 2025, marcando a quinta queda em seis meses e confirmando o desaquecimento da atividade econômica. O setor de supermercados, que representa a maior fatia do varejo, também apresentou retração, mesmo com a redução dos preços dos alimentos em alguns períodos.
Selic a 15% Pressiona Empresas e Consumidores
A taxa Selic foi mantida em 15% ao ano pela terceira vez seguida em novembro de 2025, representando o maior patamar em 20 anos. Para o varejo, isso significa custos mais elevados em toda a cadeia operacional. O crédito para empresas ficou mais caro, dificultando a compra de mercadorias pelos lojistas e encarecendo o capital de giro necessário para manter as operações.
Os consumidores também sentem o peso desses juros. As taxas para pessoas físicas atingiram 58,44% ao ano, tornando financiamentos e empréstimos praticamente inacessíveis para grande parte da população. Com isso, até produtos básicos ficam fora do alcance de muitas famílias brasileiras.
Desafios para o Fim de Ano
Tradicionalmente, o último trimestre é o período mais aquecido para o varejo, com Black Friday e Natal impulsionando as vendas. Porém, 2025 trouxe desafios inéditos. Além dos juros altos e da inadimplência, o setor enfrenta baixo estoque e escassez de mão de obra temporária. Os juros elevados dificultam a aquisição de mercadorias pelos lojistas, enquanto o mercado de trabalho aquecido reduz a disponibilidade de funcionários temporários.
Mesmo com o 13º salário injetando R$ 30,8 bilhões na economia paulistana, o recurso extra deve ser parcialmente absorvido para pagamento de dívidas. Isso limita o potencial de compras do consumidor justamente no período mais importante para o comércio.
Setores Mais Afetados pela Crise do Varejo
A retração não atinge todos os segmentos igualmente. Equipamentos de informática e comunicação registraram queda de 3,1%, enquanto tecidos, vestuário e calçados recuaram 2,9%. Por outro lado, alguns nichos conseguiram crescimento modesto, como móveis e eletrodomésticos, que avançaram 1,5%.
Projeções indicam retração de 1,25% no varejo ampliado no quarto trimestre de 2025 em comparação ao mesmo período de 2024. Apenas segmentos específicos, como vestuário e artigos farmacológicos, demonstram expectativas positivas impulsionadas pela sazonalidade de fim de ano.
Empresas Também Enfrentam Inadimplência Recorde
O problema não se limita aos consumidores. Dados da Serasa Experian mostram que as empresas iniciaram 2025 com recorde de inadimplência, com sete milhões de estabelecimentos inadimplentes ao final de outubro, o maior número da série histórica. Esse grupo representa cerca de um terço dos empreendimentos nacionais, evidenciando o impacto sistêmico dos juros elevados.
Estratégias para Sobreviver à Tempestade
Diante desse cenário adverso, os lojistas buscam alternativas para manter as vendas. A saída tem sido focar em promoções e condições exclusivas, além de estender pagamentos com parcelamentos no cartão. Oferecer descontos à vista para capturar a renda extra do 13º salário também faz parte das estratégias adotadas pelos comerciantes.
Especialistas recomendam que os varejistas sejam criteriosos ao precificar as promoções, criem cadastros de clientes bons pagadores e incentivem vendas parceladas no cartão de crédito. Contudo, todas essas medidas esbarram na realidade de um consumidor com orçamento apertado e acesso limitado ao crédito.
Perspectivas para 2026
Segundo o boletim Focus, pesquisa semanal com analistas de mercado, a taxa básica deve ser mantida em 15% ao ano até o fim de 2025 ou início de 2026. A divergência está apenas no momento em que os juros começarão a cair no próximo ano, mas não há consenso sobre quando isso acontecerá.
O ajuste da economia para 2027 será uma missão para o novo governo, mas poderá ficar muito mais difícil se a economia chegar demasiadamente enfraquecida ao final de 2026. O prolongamento da Selic em patamares elevados pode sufocar ainda mais o varejo e comprometer a recuperação econômica do país.
Impacto Social da Crise do Varejo
Além das questões econômicas, a crise no varejo e os juros altos geram consequências sociais graves. A faixa etária mais afetada pela inadimplência é a de 30 a 39 anos, onde mais da metade dos brasileiros está com o nome negativado. Essa é justamente a população economicamente ativa, que deveria estar impulsionando o consumo e a economia.
O cenário atual exige planejamento financeiro rigoroso tanto de empresas quanto de consumidores. Para os varejistas, a necessidade é encontrar o equilíbrio entre oferecer condições atrativas e manter a saúde financeira do negócio. Para os consumidores, o desafio é priorizar gastos essenciais e buscar renegociar dívidas antigas antes de assumir novos compromissos.
Conclusão
A crise do varejo brasileiro em 2025 resulta da combinação explosiva entre juros recordes, inadimplência histórica e queda no poder de compra. Com a Selic em 15% ao ano, tanto empresas quanto consumidores enfrentam dificuldades para acessar crédito, investir e consumir. O setor comercial vive um dos períodos mais desafiadores desde a recessão de 2015, com perspectivas de recuperação apenas para 2026 ou 2027.
Enquanto aguardam a redução dos juros, lojistas e consumidores precisam adotar estratégias cautelosas, priorizando a sustentabilidade financeira e evitando endividamentos excessivos. O futuro do varejo depende não apenas da política monetária, mas também da capacidade de adaptação de todos os agentes econômicos a essa nova realidade de crédito restrito e custos elevados.
Fontes: Bahia Economica, Capital S/A, Mercado&Consumo, Monitor Mercantil, CNDL, Portal do Comércio, IEDI, Nubank, Agência Brasil












